hoje nuvens trouxeram consigo o grito da floresta que morria foi o dia em que o sudeste anoiteceu porque nos corações dos homens de bem nunca amanhece o cinza esconde agora o azul que chora e é por isso que não chove uma camada de tristeza encobre o céu a gente olha pra cima e não vê noite estrelada as estrelas olham pra baixo e não reconhecem os homens a gente só vê céu cinza mas é no nosso planeta que falta cor os olhos ardem, a mata chora o Pantanal em crise o Cerrado triste a Amazônia em chamas o Capital não ama, a capital em nuvens a floresta clama, pede ajuda um jacarandá grita por socorro o fogo ofusca a voz que sai de suas folhas um lobo-guará corre entre as chamas morre antes de terminar sua jornada uma mãe tamanduá-bandeira amanhece em cinzas por tentar salvar seu filhote um veado campestre olha em desespero o incêndio uma onça-pintada se assusta e silencia um papagaio assistirá sozinho todos os dias o pôr do sol por perder sua fêmea durante a fuga no meio do caos no centro da queimada enquanto isso máquinas invadem os campos para colheita de cana-de-açúcar e retirada de madeira homens provocam incêndios
na disputa pela posse de terras o ministro do turismo visita de terno e sapatos um fervedouro no jalapão para levar asfalto à cidade de mateiros para levar o progresso e o regresso para levar a morte à fauna, à flora, à vida enquanto isso o mandatário do país defende a caça fazendeiros compram chapéus caros fazem rezas a deus aos domingos e na semana infernos no cerrado enquanto isso uma bala de carabina encontra o peito de um jovem guarani-kaiowa que foge do genocídio indígena assim como uma jaguatirica corre do fogo que invade sua casa enquanto isso um ipê nasce na terra seca passem de longe, caminhonetes, tratores, rio de aço do tráfego. um ipê ainda amarelado ilude a polícia, rompe o cerrado façam completo silêncio, paralisem os negócios garanto que um ipê nasceu sento-me no sol do tocantins às três horas da tarde e em são paulo já é noite lentamente passo a mão nessa forma insegura vindo do norte, nuvens cinzas avolumam-se. ventos brancos movem-se no ar, o verde em pânico está seco. mas é um ipê. furou o asfalto, o incêndio, o nojo e o ódio
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